segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

"Meu ser é de faca e não de flor"

Não me lembro quando foi a última vez que postei por aqui. Engraçado, ontem mesmo pensei em postar, acho que varria a casa enquanto me veio algo para escrever que, por fim, não escrevi. Tenho essa coisa em mim, em que só escrevo quando não consigo. E eu tenho lido coisas tão fortes, por exemplo, Caio Fernando Abreu, que é um autor que eu não conhecia, mas já me encantei. Fora a literatura densa de "A paixão segundo G.H", muitíssimo forte, e que me faz pensar se eu realmente tenho a "alma formada" que foi o que, previamente, Clarice Lispector sugeriu que os leitores dessa obra tivessem. E acho que não tenho.

E, um dos trechos de Caio Fernando Abreu que me deixou barbarizada diante a audácia (se é que posso assim dizer), foi esse, em que é impossível, alguém com o mínimo de sentimentalismo, não se chocar com a comparação, mas que não deixa de ser uma bela definição de algo que tanto tentamos em vão entender:.

"E se realmente gostarem? Se o toque do outro de repente for bom? Bom, a palavra é essa. Se o outro for bom para você. Se te der vontade de viver. Se o cheiro do suor do outro também for bom. Se todos os cheiros do corpo do outro forem bons. O pé, no fim do dia. A boca, de manhã cedo. Bons, normais, comuns. Coisa de gente. Cheiros íntimos, secretos. Ninguém mais saberia deles se não enfiasse o nariz lá dentro, a língua lá dentro, bem dentro, no fundo das carnes, no meio dos cheiros. E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor? Quando você chega no mais íntimo, No tão íntimo, mas tão íntimo que de repente a palavra nojo não tem mais sentido. Você também tem cheiros. As pessoas têm cheiros, é natural. Os animais cheiram uns aos outros. No rabo. O que é que você queria? Rendas brancas imaculadas? Será que amor não começa quando nojo, higiene ou qualquer outra dessas palavrinhas, desculpe, você vai rir, qualquer uma dessas palavrinhas burguesas e cristãs não tiver mais nenhum sentido? Se tudo isso, se tocar no outro, se não só tolerar e aceitar a merda do outro, mas não dar importância a ela ou até gostar, porque de repente você até pode gostar, sem que isso seja necessariamente uma perversão, se tudo isso for o que chamam de amor. Amor no sentido de intimidade, de conhecimento muito, muito fundo. Da pobreza e também da nobreza do corpo do outro. Do teu próprio corpo que é igual, talvez tragicamente igual. O amor só acontece quando uma pessoa aceita que também é bicho. Se amor for a coragem de ser bicho. Se amor for a coragem da própria merda. E depois, um instante mais tarde, isso nem sequer será coragem nenhuma, porque deixou de ter importância. O que vale é ter conhecido o corpo de outra pessoa tão intimamente como você só conhece o seu próprio corpo. Porque então você se ama também."


Recomendo a visita ao blog SEM AMOR. SÓ LOUCURA.